A temporada 2016 está definitivamente marcada na vida e na carreira de Igor Monteiro: ele foi o primeiro árbitro com paralisia cerebral do futebol de sete em toda a história das Paralimpíadas e um dos representantes de Juiz de Fora nos Jogos Paralímpicos Rio 2016.
Em entrevista exclusiva ao Toque de Bola, ele contou sua trajetória e definiu a sua atuação no evento como a “sensação de você estar participando de um momento único”.
Igor Monteiro participou de quatro jogos do torneio de futebol de sete: Ucrânia 6 x 0 Irlanda, Grã-Bretanha 1 x 2 Ucrânia, Irlanda 1 x 5 Grã-Bretanha e Irlanda 1 x 2 Estados Unidos.
Confira abaixo, mais um vídeo exclusivo do Toque de Bola. O Portal Toque de Bola tem cobertura diferenciada do esporte local com apoio do Plasc.
O começo
Eu iniciei na arbitragem em 2009. Eu tinha 19 anos e estava no primeiro período do curso de Educação Física. Quando eu tive a oportunidade de realizar um curso de arbitragem de futsal pela Liga Juiz-Forana de Futsal com o professor Adilson Mattos. Posteriormente, atuando em competições municipais e regionais na cidade eu comecei a trabalhar em partidas de futebol de campo também. O meu ingresso no futebol de sete foi através do professor Álvaro Quelhas, que me fez um convite para atuar no Campeonato Brasileiro de Futebol de Sete de 2013. Foi onde eu comecei na modalidade. Posteriormente atuei no Campeonato Brasileiro de Futebol de Sete de 2015, que foi em Águas de Lindóia. Esse ano eu fui convocado para as Paralimpíadas em março.
As aulas do professor ‘Alfredão’
O meu professor de educação física na Escola Adventista aqui em Juiz de Fora, o professor Alfredo Coimbra, me relatou que um dia durante uma aula do ensino fundamental – isso foi entre a quinta e a oitava séries, não sei exatamente qual ano. Mas ele me relatou que a gente estava tendo uma aula de Educação Física, num dia que choveu, assistindo a um vídeo sobre Olimpíadas e Paralimpíadas. Ao final da aula eu esperei todos os alunos saírem da sala e perguntei a ele: ‘professor, como eu faço para chegar lá?’ e ele me contou que estava muito feliz de ter contribuído para isso. Ele falou: ‘poxa, Igor, que legal! Um dia você estava me perguntando como você fazia para chegar lá e hoje você chegou lá’. Isso em conversa que eu tive com ele logo depois que eu fui convocado.
Alfredo e Igor se encontram em rodada da Copa Toque de Bola de Futsal
A participação nas Paralimpíadas
Foi muito emocionante. A sensação de você estar participando de um momento único, nas primeiras Olimpíadas e Paralimpíadas da América do Sul. Primeira vez no Brasil e na América do Sul. Então é essa sensação: de você estar vivendo uma coisa que você nunca vai viver novamente. Essa experiência com os atletas na Vila Paralímpica foi uma experiência impar. Conviver com diferentes culturas, ter contato com homens e mulheres de referência no esporte paralímpico. Foi uma experiência indescritível.
O primeiro árbitro com paralisia cerebral na história das Paralimpíadas
Eu fiquei muito feliz de ser o primeiro árbitro de futebol de sete com paralisia cerebral da história das Paralimpíadas. Eu vejo que isso é muito importante para o empoderamento das pessoas com deficiência. Eu espero que essa minha participação nas Paralimpíadas estimule outras pessoas com deficiência a se tornarem árbitros e árbitras em diferentes modalidades, não só no futebol, e também que possam atuar como gestores esportivos e gestoras, técnicos e técnicas. A gente vê que o lugar da pessoa com deficiência no esporte não é somente como praticante ou como jogador ou jogadora: ela também pode estar nesses cargos de tomada de decisão.
Encontrou algum atleta que gostaria de conhecer?
Atletas que eu gostaria de conhecer, especificamente, eu não fui com nenhuma aspiração de tentar conhecer esse ou aquele atleta. Eu fui querendo conhecer pessoas, conhecer histórias, principalmente histórias das mulheres no esporte. Por ser um pesquisador das temáticas de Educação Física e Gênero eu estava muito atento às histórias de mulheres nas Paralimpíadas. Tive a oportunidade de ter contato lá com grandes histórias, com jogadoras de tênis em cadeiras de rodas, com jogadoras de goalball. Foi uma experiência muito enriquecedora.
Encontro com torcedora iraniana
Tive a oportunidade de encontrar uma torcedora iraniana nos jogos de futebol de sete. Considerando que as mulheres são proibidas de frequentar estádios de futebol no Irã, foi uma experiência riquíssima esse contato com essa torcedora. Em todas as partidas do Irã ela ia, amarrava sua bandeira na arquibancada e torcia pela sua equipe. Eu acabei tirando uma foto com ela. Para quem estuda essas temáticas essa foto vale ouro. Você está vendo ali uma mulher iraniana tentando um empoderamento. Ela está ali vivendo coisas que ela não tem a oportunidade de viver no país dela.
Igor posa ao lado da torcedora iraniana na Arena em Deodoro (Foto: Acervo pessoal)
Teve polêmica de arbitragem?
Graças a Deus nas partidas que eu atuei, não. Eu atuei em quatro partidas como árbitro assistente. O jogo mais complicado para mim, na minha visão, foi a minha estreia, que foi Ucrânia e Irlanda. Porque a estreia a gente às vezes fica um pouco ansioso antes da partida. A noite antes da partida é muito importante se você vai dormir bem ou não. Graças a Deus eu consegui dormir bem, fazer uma boa partida, fazer uma partida bem tranquila. Eu tive muito apoio dos colegas da arbitragem que estavam comigo nesse jogo, em especial o Alexandre Santos, que foi o árbitro da partida. Ele me deu bastante apoio antes do jogo, conversou bastante comigo. E o nosso diretor de arbitragem também, o professor Álvaro Quelhas, conversou bastante comigo antes do jogo, me deu bastante apoio. Essa minha boa atuação na estreia foi fundamental para que eu conseguisse ir bem nas outras três partidas da competição.
Ucrânia x Irlanda foi a partida de estreia de Igor, primeiro na direita (Foto: Acervo pessoal)
Árbitros hospedados na Vila Paralímpica
Foi uma experiência riquíssima. A gente ter oportunidade de conviver com atletas de diversas nacionalidades. Se não me engano 176 países. Então é uma experiência que você nunca vai ter novamente, a não ser que você vá para uma outra Olimpíada ou Paralimpíada. Você ter essa oportunidade de ter contato com atletas em ambientes diferentes do ambiente competitivo, você estar ali por vezes com eles em alguns momentos de lazer, que tinha um centro de recreação lá. Às vezes a gente estava em contato com eles nesse centro de recreação, tinha possibilidade de trocar uma ideia, pedir para tirar uma foto, de contar histórias. Foi uma experiência riquíssima. E eu fiquei muito feliz de ver histórias de mulheres no esporte paralímpico. Grandes histórias, grandes mulheres que estão fazendo história no desporto paralímpico.
Diferença na cobertura da mídia em relação aos Jogos Olímpicos
O que a gente percebe é que o desporto paralímpico tem muito menos visibilidade do que o esporte olímpico. A gente observa no número de horas que a televisão dedicou às transmissões olímpicas e paralímpicas. Se a gente for analisar a questão da TV aberta brasileira, a gente observa que tivemos três emissoras fazendo transmissão ao vivo dos Jogos Olímpicos e nos Jogos Paralímpicos nós tivemos apenas a TV Brasil. É importante a gente ressaltar que ela esteve fazendo essa cobertura. E o SporTV na TV fechada. Então a gente observa um número muito menor de horas dedicadas à cobertura dos esportes paralímpicos. Um número menor de fotógrafos e repórteres nos locais de competição. Isso é uma percepção que eu tive observando as arquibancadas, os locais dedicados à imprensa na Vila Paralímpica e nos locais de competição.
Igor posa para a foto antes de Grã-Bretanha x Ucrânia (Foto: Acervo pessoal)
Igor também participou da partida entre Irlanda x Estados Unidos (Foto: Acervo pessoal)
Mérito Esportivo Panathlon
No dia 8 de dezembro, Igor esteve no seleto grupo de 25 agraciados com o Mérito Esportivo Panathlon, maior reconhecimento esportivo de Juiz de Fora e região, promovido pelo Panathlon Club Juiz de Fora. O Panathlon comemora 40 anos de fundação e a noite da entrega do Mérito e da Comenda Carlos de Campos Sobrinho ainda alcança grande repercussão, não só na cidade mas em todo País, pela projeção dos atletas, treinadores, árbitros, entidades e empresas premiados, e nas cidades e nos países em que o clube tem representação.
Igor Chagas Monteiro recebe Mérito Esportivo Panathlon 2016 – Arbitragem de Futebol de Sete Paralímpico – entregue pelo panathleta Antônio Carlos Reiff Werneck
Texto: Toque de Bola – Lucas Bernardino, edição Ivan Elias
Vídeo: Ivan Elias e Fabrício Passos Braga
Fotos: Acervo pessoal / Igor Monteiro e Tintim/Panathlon Club Juiz de Fora