Juiz de Fora (MG), 16 de março de 2012
Uma das principais atletas de Juiz de Fora vive um momento de reflexão sobre o futuro de sua carreira. Trata-se de Roberta Stopa. Ela se planejou para ajudar a modalidade a garantir uma vaga nos Jogos Olímpicos de Londres e depois tentar ser a representante brasileira. A situação não era fácil. Em 27º no ranking da União Ciclística Internacional (UCI), o time feminino precisava ganhar nove posições até 23 de maio, já que apenas os 18 primeiros países ganhariam a vaga. Apesar da dificuldade, Roberta acreditava que seria possível. Mas, uma decisão tomada pela Confederação Brasileira de Ciclismo pôs fim ao sonho.
No dia 17 de fevereiro, a CBC publicou texto em seu site com o título “CBC define Calendário em busca da Vaga Olímpica na disciplina de Mountain Bike”. No texto, a entidade informa que definiu a delegação e corpo técnico, sob o comando de Ruy Avancini, para realizar trabalho específico visando a vaga olímpica no MTB masculino. Os esforços passariam a ser concentrados nos três atletas melhores colocados no ranking da UCI: Rubens Donizete Valeriano, Henrique Avancini e Edivando Souza Cruz. Eles teriam oito provas pela frente para assegurar a classificação, sendo quatro internacionais e outras quatro no Brasil.
Entretanto, no mesmo texto foi informado que, em relação ao naipe feminino, a “CBC realizou uma análise criteriosa e acabou concluindo que não seria possível alcançar a pontuação necessária para a classificação olímpica, uma vez que as atletas deveriam aumentar o rendimento da pontuação em quase 100% no curto período de 4 meses, para que desta forma fosse recuperada a grande diferença dos 20 meses de classificação já ultrapassados”.
A decisão revoltou Stopa. Como se não bastasse, ela lamenta que após esse episódio, as atletas femininas sequer foram convocadas para o Campeonato Panamericano. Em 11 de março, a juiz-forana, após vencer a Taça Brasil, em Curitiba, desabafou.
Clique aqui e confira o desabafo de Roberta.
“Pela matemática, estava mais fácil para o masculino conseguir a vaga. Mas nós também tínhamos chances, principalmente vendo as competições que os meninos têm pela frente. Se tivéssemos ido competir na Costa Rica (Copa Nacional, em 26 de fevereiro), teríamos pontuado e ganho, ao menos, duas posições. Sem falar nos pontos que conseguiríamos no último final de semana em Curitiba”, disse.
Questionada como estava se sentindo diante da situação, a biker resumiu em uma palavra: indignação. “Estou me sentindo indignada. O MTB feminino cresceu muito. O número de homens e mulheres nas trilhas é muito semelhante. Às vezes, fico pensando se não é melhor investir na vida pessoal. A palavra que se encaixa melhor é indignação”, resumiu.
Diante da situação, Stopa enviou carta ao presidente da Confederação Brasileira de Ciclismo. José Luiz Vasconcellos. Veja abaixo o texto enviado pela atleta.
Bom dia Presidente Vasconcellos,
Há dias me encontro de frente ao meu computador na tentativa de lhe escrever, mas primeiro eu precisava controlar meus sentimentos e indignação com as notícias sobre a categoria feminina.
Como é de seu conhecimento, em 16 anos de carreia nunca me expus para reclamar, lutar ou até mesmo protestar por alguma coisa, mas dessa vez não poderia deixar de fazer o que venho fazendo.
São 2 assuntos que me incomodam e me alimentam nesses protestos mesmo sabendo que a essa altura do campeonato o 1º deles já começa a se tornar impossível (Olimpíadas), mas irei lutar até o dia 23 de maio que é a data limite.
O segundo e mais recente (Panamericano) tenho certeza que ainda há tempo de rever. Somos medalha de BRONZE no Panamericano de 2011 no Team Relay e fui 8ª colocada numa edição pesada por conta da altitude e vaga olímpica. Não podemos deixar a categoria acabar dessa forma, logo agora que tem crescido a cada campeonato. Temos que, no mínimo, convocar uma delegação completa para que possamos brigar de igual com outros países, defender nossa medalha e brigar por colocações individuais, mesmo sabendo que o Team Relay não vale pontos para ranking olímpico (objetivo paralelo).
Fica meu apelo não só pela categoria feminina, mas também pelas categorias de base (Sub-23 e Júnior) que é o futuro do nosso esporte.
Fico no aguardo de uma resposta.
Grata desde já pela atenção e compreensão,
Roberta Stopa
Atleta Profissional
Mountain Bike
Argumentos
A reportagem do Toque de Bola entrou em contato com a assessoria de imprensa da CBC para saber o porquê da decisão. O órgão informou que faz parte de uma estratégia para “centrar esforços no que é possível”. A assessoria de imprensa chegou a dizer que não há motivo para esse “barulho todo”, já que as atletas é que deveriam ter se preocupado em estar bem no ranking internacional nos últimos dois anos. Questionada se a decisão não traria um desestímulo para as mulheres, até mesmo visando o Jogos de 2016, informou não acreditar nesta hipótese, já que a CBC “continua investindo no masculino e feminino”. Por fim, a assessoria da CBC orientou a equipe do Toque de Bola e conversar com o técnico da Seleção Brasileira de Mountain Bike, Ruy Avancini. Entretanto, ao ligar para o número informado pela assessoria da CBC, nossa equipe foi informada que “Ruy estava viajando para fora do País”.
Também entramos em contato com a assessoria de comunicação do Comitê Olímpico Brasileiro (COB) para saber o posicionamento do órgão sobre o assunto. Enviamos, via e-mail, os seguintes questionamentos: Como o Comitê Olímpico Brasileiro enxerga o fato de a CBC desistir de lutar pela vaga olímpica quando as atletas ainda tinham chances de garantir vaga em Londres? Essa decisão não fere o espírito olímpico? Está faltando verba para a entidade enviar seus atletas para competições que pontuam no ranking internacional, que define as vagas para os Jogos Olímpicos? No dia seguinte, obtivemos retorno da assessoria com o seguinte posicionamento: “Está é uma opção do departamento técnico da Confederação Brasileira de Ciclismo, após avaliar as possibilidades de classificação de suas diversas modalidades. Não cabe ao COB comentar.”
Texto: Thiago Stephan