
A gente pensa no futebol como uma fonte inesgotável de alegria. No entanto, nesta semana, durante uma conversa, eu comentei que a inveja move o futebol.
Segundo o dicionário Oxford, inveja é “desgosto provocado pela felicidade ou prosperidade alheia” e “desejo irrefreável de possuir ou gozar o que é de outrem”.
Claro que não é o único sentimento, mas está ali, fomentando várias atitudes encontradas na modalidade. Duvida?
Um clube aposta em um treinador jovem e tem resultado? Vários outros investem no mesmo perfil de profissional.
O Flamengo trouxe Jorge Jesus e saiu varrendo campeonatos? Não faltaram dirigentes procurando um português para chamar de seu comandante.
A estratégia do momento é se transformar em uma Sociedade Anônima do Futebol (SAF)? Então, “vambora”!
Se vai dar certo, ninguém sabe. Claro que nem sempre o que funciona em um terá o mesmo resultado em outro. No entanto, para dar satisfação ou escapar da cobrança, algo precisa ser feito.
Além desse aspecto, ainda tem o fato da rivalidade. A grosso modo (não dá para generalizar), o torcedor e os dirigentes não suportam ver o sucesso do adversário, especialmente se o próprio momento for para chorar rios de lágrimas.

Foto: EC Bahia/Twitter
Ódio, selvageria e ignorância
Em um mundo civilizado e educado, as pessoas saberiam lidar com este sentimento. Só que não é o que a gente vê. Eis o pontapé inicial para a inveja desencadear a raiva e o ódio, que evoluem para resultar em fatos lamentáveis como os ataques com bombas ou pedradas aos ônibus das delegações do Bahia, do Náutico, do Grêmio e do Paraná.
Os casos aconteceram em um pequeno intervalo de dias no mês de fevereiro. Foram apontados como responsáveis desde os próprios torcedores até os adversários, que não suportam a existência do rival – mesmo que ele não esteja tão bom assim.
Na semana passada, o árbitro de Atlético e Cruzeiro foi ameaçado de morte por marcar um pênalti, sem o apoio do VAR, que só entra em campo nas semifinais do Mineiro. Isso horas depois de um torcedor cruzeirense ser morto em um confronto contra atleticanos em um bairro da capital.
Quando chega à violência, não basta dizer que é caso de terapia. Em se tratando do futebol brasileiro e de outros casos já registrados, ao que tudo indica, independente da causa, enquanto não houver uma punição exemplar, as manchetes e as tragédias baseadas na ignorância e na selvageria vão continuar se repetindo.

O que vale a pena no futebol jogado pra escanteio
Claro que preferia falar sobre a admiração, o respeito, a alegria, a sensação de pertencimento. O momento infelizmente não me permite tampar o sol com a peneira. No fim das contas, com a bola rolando impulsionada pela inveja, pelo ódio e pela ira, para muitas pessoas como eu, só restam a tristeza e a vergonha.
Se esta é a caixa de Pandora, ainda podemos esperar por uma luz no fim do túnel. Diz a história grega, que ao abrir e soltar sentimentos ruins, Pandora fechou a caixa, deixando a esperança trancada lá dentro. Para a gente libertar e colocar em prática a esperança para obter dias melhores, algo precisa ser feito.
Não vai cair do céu. Não será em um passe de mágica. Não basta ter fé em dias melhores. Chovendo no molhado das famosas águas de março: já passou muito da hora de algo realmente ser feito. E tem que ser além da conscientização. Não faltam campanhas pela paz no futebol.
Os setores envolvidos no futebol precisam sair da inércia para que estes casos não sejam mais alguns em uma lista sem fim. Ou será que vão preferir jogar os verdadeiros valores e os melhores sentimentos despertados pelo esporte para escanteio?