Mérito Panathlon 2015, Rafael lembra título brasileiro contrariando médico e fala em aposentadoria

  A trajetória de Rafael Henrique Moreira da Silva no tumbling, modalidade da ginástica de trampolim, emociona e motiva. Duas características, aliás, onipresentes nos mais de 20 anos do atleta no esporte, hoje campeão brasileiro de elite no aparelho. Eleito no Mérito Esportivo Panathlon 2015 como um dos destaques esportivos juiz-foranos na temporada, Rafael concedeu entrevista ao Toque de Bola, ajudando a contar sua história, um exemplo de vida, e já assumindo aposentar-se dos aparelhos.

Prazer, tumbling

“Fui em uma apresentação de uma prima minha que fazia ginástica, eu devia ter 7 anos de idade e despertou meu interesse. Passei pela capoeira, só que a parte dos saltos sempre me chamou atenção. Com 8 anos, meus pais me colocaram na ginástica, onde comecei a treinar e cai direto no tumbling. Com pouco tempo de treino já estava disputando Campeonato Brasileiro e com 9 anos já estava em Mundial”, relembra Rafael.

A carreira

Rafael encorpou seu currículo no esporte acumulando participações em campeonatos estaduais, nacionais e até mundiais: “Sou dez vezes campeão mineiro, participei de mundiais no Canadá, Austrália, Dinamarca, Holanda. Na categoria principal,a  elite, disputei três mundiais: Canadá em 2007, Rússia em 2009 e França em 2010”.

Momento mais difícil

Rafael se preparava para um 2011 ainda melhor. Mundial na Inglaterra e, antes, o sonho do primeiro Campeonato Brasileiro conquistado. Nele, no entanto, um salto mudaria seu destino. Em uma queda, o atleta rompeu quatro ligamentos do joelho direito – dois cruzados e dois colaterais, menisco medial e músculo poplíteo. Em avaliação médica, Rafael recebeu a notícia de que havia o risco de perder os movimentos da perna e, até, amputá-la. O tumbling não poderia mais ser praticado. O adeus precoce parecia inevitável. Parecia.

“Fui muito realista. Quando o médico disse que tinha chance de amputar, eu não pensava muito nisso. Lógico que me assustou e aos meus pais na época, mas o que mais doía era o fato de não poder fazer o que mais gostava, parar minha carreira forçado. Escutei gente falar que eu nunca mais andaria normalmente, que sempre ia sentir dor, e graças a Deus não tenho limitações hoje. E isso me motivava, sou um pouco teimoso. A pessoa falava que eu não iria conseguir, então eu batalhava até conseguir. Foi uma válvula que me motivou a treinar e sempre quis voltar, falava para o Wanderson isso desde que me machuquei”, contou o atleta.

O maior salto

As cirurgias foram realizadas em Belo Horizonte e a fisioterapia em Juiz de Fora, com o profissional Rodrigo Soares. Já em 2012, Rafael voltou a pular – e a treinar. Com a necessária precaução ao lado do técnico Wanderson Zambelli, as atividades foram evoluindo e o nível dos movimentos aumentava com o passar do tempo e a confiança da dupla. Já em 2015, Rafael estaria no mesmo torneio presente em seus sonhos bons e ruins: o Brasileiro de elite, torneio em que almejava ser campeão e que sofrera a triste queda. A vontade do atleta falou mais alto e, mesmo após a lesão, Rafael levou a medalha de ouro da competição, surpreendendo a todos e gravando o momento como um dos mais emocionantes da vida do atleta:

“Em toda essa trajetória que tive depois minha lesão, cada treino foi uma vitória, porque eu e o Wanderson falávamos ‘vamos voltar, mas competir tem que ver se dá’. Cada atividade a gente via que dava para tentar um pouco mais e isso foi alavancando nosso treino. Falar que não emociona depois de tudo o que passei é mentira, mas o fato de eu ter sido campeão brasileiro, um título que eu não tinha, me emociona, e depois que acabaram minhas cirurgias, passou um tempo e meu pai veio a falecer e dedico tudo a ele e a minha família. Me apoiaram e deram força, apesar do medo quando falei que voltaria a treinar”, confidenciou o campeão brasileiro, que ainda conquistou o título nacional também por equipes.

Rafael no pódio do Brasileiro de elite desta temporada
Rafael no topo do pódio do Brasileiro de elite desta temporada

Professor orgulhoso

Treinador de Rafael, Zambelli já estava acostumado com pódios no tumbling, mas admitiu que a conquista teve um gosto especial e lembrou do esforço de seu aluno após as lesões:  “O Rafael passou por uma lesão muito difícil com quatro anos de recuperação. Se esforçou muito nas fisioterapias e na recuperação muscular depois. Fiquei muito feliz com o título, adoro fazer campeões brasileiros no tumbling”, relatou Wanderson.

Abraço de Wanderson em Rafael na premiação do Brasileiro de elite
Abraço de Wanderson em Rafael na premiação do Brasileiro de elite

Aposentadoria dos aparelhos

Aos 28 anos, Rafael acredita que sua trajetória como atleta deve ser finalizada. Também ex-treinador, o campeão brasileiro de elite no tumbling não vê condições financeiras de seguir na área, além dos problemas estruturais na cidade e a falta de apoio que parte do empresariado local e se estende à Confederação Brasileira de Ginástica (CBG):

“Sou formado em Educação Física há cinco anos, hoje tenho um estúdio de personal trainer, onde trabalho em tempo integral. Por fatores de remuneração, não penso em voltar a trabalhar com ginástica. E sobre voltar a treinar, só queria mais um ano de competição, era o que tinha programado com o Wanderson, então a princípio aposentei. Se tivesse uma estrutura boa em JF, às vezes até treinaria mais um ano. Para disputar um Mundial pagávamos praticamente tudo: hospedagem, alimentação, passagem aérea. A CBG não pagava nada para o tumbling nem para o duplo-mini. A cama elástica, modalidade olímpica, disputava a mesma competição que a gente ia e tinha tudo de graça, então é complicado. No Mundial da Rússia chegamos a desembolsar quase R$10 mil para estar participar e sem nenhum reconhecimento nem uniforme da CBG”, desabafou.

Mas se engana quem pensa no fim da história de Rafael com o tumbling. O exemplo de sua carreira manterá por muitos anos viva a esperança de jovens em um futuro melhor, ligado ao esporte, sempre com emoção e motivação.

 

Texto: Bruno Kaehler – Toque de Bola

Fotos: Arquivo pessoal

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Ivan Elias

Ivan Elias, associado do Panathlon Club de Juiz de Fora, é jornalista, formado em Comunicação Social pela UFJF. Trabalhou por mais de 11 anos no Sistema Solar de Comunicação (Rádio Solar e jornal Tribuna de Minas), em Juiz de Fora. Participou de centenas de transmissões esportivas ao vivo (futebol, vôlei, etc). Apresentou diversos programas de esporte e de humor, incluindo a criação de personagens. Já foi freelancer da Folha de S. Paulo, atuou como produtor de matérias de TV e em 2007 e 2008 “defendeu” o Tupi, na Bancada Democrática do Alterosa Esporte, da TV Alterosa (SBT-Minas). Criou, em 2010, ao lado de Mônica Valentim, o então blog Toque de Bola que hoje é Portal, aplicativo, Spotify, Canal no Youtube e está no Twitter, Instagram e Facebook, formando a maior vitrine de exposição do esporte local É filiado à Associação Mineira de Cronistas Esportivos (AMCE) e Associação Brasileira de Cronistas Esportivos (Abrace).

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