Uma história bonita para contar. Assim se passam na cabeça do treinador do JF Vôlei, Henrique Furtado, as cenas vividas por ele e pelo grupo de atletas, Comissão Técnica e dirigentes da equipe, um dia depois da derrota para o Taubaté, nos playoffs, que encerrou a melhor campanha de uma equipe local em seis anos consecutivos de participação na Superliga masculina.
Em conversa franca com o Toque de Bola, Henrique fala sobre a mentalidade vencedora dos atletas que, assim como ele, vieram do Sada Cruzeiro na parceria com o JF, analisa os valores que foram destaque e que não pertencem ao Sada, meritocracia, trabalho de base, o esporte de Juiz de Fora, os playoffs diante do Taubaté e a possibilidade de renovação da parceria entre as equipes de Juiz de Fora e Belo Horizonte.
TOQUE DE BOLA – Fale um pouco do início do trabalho. Como foi que ficou sabendo dessa possibilidade de jogadores e integrantes da Comissão Técnica virem para o JF Vôlei, para a Superliga? Como foi isso lá dentro do Sada, entre vocês?
Henrique Furtado – “A formação do elenco e a formação da comissão técnica foram feitas em comum acordo com o Maurício Bara, com o Marcelo Mendez, e com a diretoria do Sada. Eu propus alguns nomes da Comissão Técnica, que foram aceitos por ambas as partes. Conseguimos formar uma comissão técnica muito dedicada, muito boa e muito trabalhadora. Uma comissão técnica pequena, são quatro integrantes. Só que uma comissão técnica extremamente dedicada, trabalhadora e capaz. Ao meu lado trabalham o Júlio Lanzelotti, preparador físico, o Rodrigo Fuentealba, assistente e estatístico, e o fisioterapeuta daqui de Juiz de Fora, Lucas Mostaro. Esses são os três integrantes, além de mim, que ajudaram e participaram o tempo inteiro do trabalho. O grupo de jogadores foi formado em função de algumas oportunidades. Alguns jogadores que não haviam fechado com outras equipes, que se inseriram dentro do processo como alguns dos pilares do time, e junto com a garotada da base, que geralmente estavam jogando a Superliga B pelo clube, e que esse ano não poderiam jogar a Superliga, em função de uma nova regra imposta pela a CBV (Confederação Brasileira de Voleibol) então teve essa união e formação do nosso elenco.”
TOQUE DE BOLA – Os dirigentes no início da temporada preferiram não fazer projeções de classificação aos playoffs. Disseram que o principal era o time permanecer entre os dez primeiros colocados e não correr risco de rebaixamento. Esse depoimento deles tirou um pouco o peso sobre o trabalho ou internamente vocês acreditavam que teriam chances de chegar a uma situação melhor na Superliga?
Henrique Furtado – “Essa fala dos dirigentes não foi para tirar o peso ou para colocar alguns parâmetros. Essa foi a mais pura realidade. Era o que foi proposto, que era permanecer com a vaga para a próxima edição da Superliga. E não é que antes de começar a temporada o nosso time já era muito bom e todo mundo esperava esse sucesso todo. Os jogadores foram evoluindo muito dentro do processo de treinamento, dos jogos, a equipe foi coletivamente crescendo demais e alcançou os feitos que alcançou. Mas essas declarações não foram de forma alguma para tirar o peso. O que aconteceu depois foi um mérito muito grande do grupo, que se superou, sobressaiu, e chegou muito longe.”
TOQUE DE BOLA – O Sada Cruzeiro tem há alguns anos uma das principais equipes não só do país, mas do continente e até do mundo. Acha que esse grupo do Sada carrega essa mentalidade vencedora?
Henrique Furtado – “O Sada Cruzeiro já são muitos anos que estão praticando o voleibol do mais alto nível no mundo, nível mundial e internacional. O time vem jogando muito bem e conquistando tudo há muitos anos. Esses garotos que vieram do Sada cresceram com esse espelho. Com espelho de jogadores vencedores, e ao mesmo tempo, de jogadores que eles acompanhavam no dia a dia, e viam o tanto que os jogadores trabalhavam para conquistar o que conquistavam. Então muitos desses ídolos que eles acompanharam de perto, acompanharam o sucesso, e acompanharam também a luta desses jogadores. Eles aprenderam muito sobre esse trabalho árduo para se conquistar grandes feitos. E sem dúvida nenhuma a convivência dentro do Sada foi uma grande influencia nessa mentalidade, nessa construção de uma mentalidade vencedora para todos os atletas também das categoria de base. Além de uma mentalidade vencedora, a construção do entendimento do processo, de como o processo deve ser, o tamanho do esforço, o tamanho da dedicação. Isso tudo foi muito importante para que esses garotos se formassem dessa forma. E conseguissem apresentar o trabalho que apresentaram.”
TOQUE DE BOLA – Situação que é comentada por torcedores, reforçada em caso de um resultado negativo: “Ah, o pessoal veio todo do Sada, eles nunca vão tirar um atleta que veio de lá para escolher um aqui de Juiz de Fora ou que não seja do Sada”. Internamente chegou a haver esse tipo de discussão?
Henrique Furtado – “A participação de atletas da cidade de Juiz de Fora no JF Vôlei ocorreu através do central Diego. Ele foi um representante da cidade nesse plantel. Hoje o trabalho da base está sendo reformulado e eu acredito muito que ele possa ser um dos grandes trabalhos de base do País no futuro, caso aconteçam muitas das coisas que estamos planejando. Todo o jogador que for aproveitado deve ser por meritocracia. Nenhum jogador será colocado no time de Juiz de Fora apenas por ser de Juiz de Fora, se ele não tiver um nível técnico para isso. Assim como nenhum atleta do Sada vai subir das categorias de base para a equipe principal se não tiver nível técnico para isso. Isso em todos os lugares corretos do mundo. O jogador tem que merecer, tem que ter nível, tem que ter trabalhado muito se quiser vestir a camisa do JF Vôlei. O trabalho de base está se fortalecendo. Nosso diretor Mauricio Bara está trabalhando muito para que o trabalho de base seja fortalecido, seja estruturado junto ao Clube Bom Pastor, que é um clube muito sério, e os jogadores para um dia chegar à equipe adulta do JF Vôlei eu acredito que devem ter nível para isso, um potencial para isso. Não pode ser um favor que a diretoria faz, de pegar jogadores daqui apenas por ser daqui. Seria muito importante se a cada ano aumentasse esse número de jogadores, mas para isso devem ter potencial, devem ter trabalho, devem ter qualidade. E por meritocracia espero que muitos desses atletas que hoje são da base em um futuro próximo possam também fazer parte do JF Vôlei.”
TOQUE DE BOLA – Fale um pouco sobre atletas que não são do Sada e foram efetivos, como Fábio Paes, Ricardo, Rodrigo, quase todos que já tinham disputado Superliga por Juiz de Fora:
Henrique Furtado – “Eu acredito que os cinco jogadores que foram contratados tiveram uma importância muito grande dentro do nosso elenco. Cada um de uma forma diferente, todos contribuíram muito para chegar nesses resultados, todos do elenco tiveram participação importante, todos os 17 jogadores. E esse grande resultado foi conquistado por um esforço de todos. Cada um da Comissão Técnica teve seu valor, cada um da diretoria, dos jogadores. Essa foi uma grande temporada e todos tiveram uma participação muito importante. O Rodrigo foi um levantador de muita categoria, fez uma grande temporada e foi um dos grandes líderes da equipe, conduziu com muito talento e com muito estudo esse time e fez uma grande temporada. O Fábio Paes, líbero de muita qualidade, um jogador muito constante, e com sua experiência, com seu caráter, contribuiu muito com o time sempre. O Ricardo, um jogador muito qualificado, que tem um espírito muito importante para o time porque é um grande guerreiro, que inflama o time, que puxa para cima o tempo inteiro. Teve uma importância muito grande no nosso elenco. O oposto Renan é um jogador de muita qualidade, uma referência do sistema ofensivo e também do bloqueio. Assumiu muita a responsabilidade do ataque, fez um grande trabalho ofensivo, foi muito importante também no bloqueio durante toda a temporada, bloqueando em todos os setores quando necessitavam, um jogador completo. E que sem dúvida nenhuma um dos grandes pilares desse time. O Diego, um central muito experiente, com uma característica parecida dos jogadores mais jovens de bom potencial de saque flutuante e de ataque. Teve uma regularidade muito grande em um momento muito importante do campeonato, foi um jogador que nos acrescentou muito e que contribuiu muito com sua qualidade e sua regularidade no ataque.”
TOQUE DE BOLA – Os playoffs: acredita que o fato de JF ter vencido Taubaté na fase de classificação (última rodada) acabou deixando o adversário, com campeões olímpicos, mais atento para as quartas-de-final? Pode falar um pouco sobre cada um dos três jogos da fase final, especialmente o último? Acha que conseguiram marcar muito bem o Renan neste terceiro jogo?
Henrique Furtado – “Eu acredito que vencer o Taubaté na fase classificatória fez com que eles entrassem cada vez mais atentos. É um time muito experiente, de muita qualidade, que já tinha acompanhado toda nossa trajetória dentro da Superliga, e visto que a gente tinha feito um bom trabalho. Eles entraram muito focados nessas quartas-de- final, assim como nós. E com grandes talentos que têm no ataque, conseguiram fazer diferença, com um grande levantador também. Pelo sistema ofensivo, conseguiram fazer a diferença e se classificar para a semifinal. Um time com muitos jogadores talentosos e um grande levantador. Eu acredito que o primeiro e o segundo jogo, depois da nossa vitória, depois de um grande jogo aqui em Juiz de Fora pela última fase classificatória, uma vitória contra esse grande time, entramos para o primeiro jogo dos playoffs. E apesar de uma derrota por 3 a 0, as parciais foram muito equilibradas, o jogo foi muito equilibrado. Acho que apresentamos um bom voleibol, principalmente no saque e no bloqueio. Depois, no segundo jogo, tivemos uma evolução muito grande no sistema ofensivo e chegamos a equilibrar o jogo com eles em relação ao sistema ofensivo. Trabalhamos muito bem o ataque com o passe quebrado, mas não foi o suficiente para vencer, já que eles mantiveram um ritmo muito agressivo no jogo todo. E na terceira partida, eles se sobressaíram. Tiveram muito sucesso no sistema ofensivo, com pouquíssimos erros. Foram agressivos o tempo inteiro no saque, e nós não conseguimos fazer uma apresentação do nível que vínhamos apresentando. E esse forte saque e uma grande eficiência no sistema ofensivo foram determinantes para que eles pudessem vencer e encerrar a série.”
TOQUE DE BOLA – Quais as projeções agora da parceria?
Henrique Furtado – “Acho que em relação à parceria acredito que as duas partes estão felizes com o resultado. Estão satisfeitas com tudo o que aconteceu, com a evolução dos jogadores, com os resultados, com as surpresas positivas que aconteceram no trabalho. Eu acho que é um momento que eles vão conversar e analisar, fazer um balanço do que foi positivo, do que foi negativo. E vão conversar sobre as possibilidades de continuidade. Ainda não tem nada definido, nada garantido. Mas é verdade que as duas partes ficaram felizes com o que aconteceu.”
TOQUE DE BOLA – Fale um pouco também sobre o grande número de amigos e familiares que vieram em vários jogos do JF, além da família do Marcelo Mendez, pelo Juan (líbero do JF, filho do técnico do Sada Cruzeiro). Formou-se mesmo uma grande família?
Henrique Furtado – “Acredito que sim. Esse grupo formou realmente uma grande família. Porque passamos por grandes desafios juntos, passamos por lindas vitórias e por derrotas que nos machucaram. Passamos por grandes ensinamentos, por grandes momentos, por dificuldade dentro e fora de quadra e nos ajudamos o tempo inteiro. O tempo inteiro esse grupo permaneceu muito junto, almoçando junto e indo para o treino junto. Um jogador que tinha carro ajudava o outro, dava carona para diminuir a distância para o treinamento. Acho que se ajudaram muito dentro e fora de quadra e traçaram, e escreveram uma linda história juntos. Sempre que possível tinha familiares na torcida. Muitas vezes a minha família estava presente: minha esposa, minha mãe, minha avó, meus tios, meus amigos. E isso foi uma grande alegria para mim, uma coisa que não é tão simples de acontecer, e aconteceu aqui. Uma coisa que me alegrou muito. Assim como os familiares de outros atletas, grandes amigos, o próprio Marcelo Mendez com sua família, que tiveram a possibilidade de vir aqui durante alguns jogos. Então, o ginásio da universidade se tornou um grande atrativo para quem gosta de um bom vôlei e para todos os nossos familiares. E isso nos alegrou muito.”
TOQUE DE BOLA – Aqui na cidade é comentário geral que podemos ter equipes competitivas no vôlei, futebol profissional, handebol, outras modalidades. O que percebeu neste período que atuou aqui sobre isso, sendo que você é de uma cidade menor – Rio Pomba. Como viu isso, agora depois de estar no dia-a-dia aqui de trabalho?
Henrique Furtado – “Bom, sobre outras modalidades sobre o desenvolvimento esportivo na cidade, acredito que a cidade tem um potencial muito grande. Tem uma população extremamente envolvida com esporte. Aonde eu vou na cidade, percebo o carinho das pessoas, o reconhecimento das pessoas. Eu acho que se existirem outros times de outros esportes com uma gestão profissional, como é a nossa, eu acredito que pode desenvolver muito a cidade. Conheço de perto a gestão do Tupynambás. São pessoas muitos serias no futebol. Torço muito para que outras modalidades também se desenvolvam, cresçam. Juiz de Fora tem um potencial esportivo enorme, mas é necessário apoio, é necessário investimento, é necessário patrocínio, é necessário suporte, estruturas, coisas que podem melhorar muito. Mas sem o apoio da iniciativa privada ou da iniciativa pública, é muito difícil de evoluir. Esperamos um desenvolvimento nesse quadro, que apareçam pessoas envolvidas em contribuir com o vôlei, com o JF Vôlei, e com outros esportes da cidade, para que Juiz de Fora possa de fato ser uma potência que tem possibilidade de ser.”
Texto: Ivan Elias – Toque de Bola
Fotos: JF Vôlei
Edição: Toque de Bola