Cloves Santos: “Saio porque está tendo muita interferência em minha pasta”

Oficializada a saída de Cloves Santos do Tupi em nota no site alvinegro nesta terça-feira, 8, o ex-vice-presidente do Conselho Gestor do clube explicou sua versão dos fatos à imprensa, justificando o desligamento sempre a partir de um ponto: “Meu jeito de futebol é o mesmo do ano passado e queriam mudar isso”.

A decisão foi anunciada mesmo após a presidente do Galo Carijó, Myrian Fortuna, conversar com o elenco do Tupi e, segundo ele, tomar conhecimento da vontade do grupo pela permanência de Cloves. O Toque de Bola apurou que o descontentamento dos torcedores com o trabalho realizado no futebol alvinegro vinha incomodando Myrian e outros diretores, que, de fato, solicitaram maior proximidade nas decisões, incluindo papel nas contratações para comissão técnica e jogadores.

 

  O pronunciamento

Inicialmente, Cloves, desde 2008 trabalhando no clube de Santa Terezinha, explicou os últimos capítulos que culminaram com o fim de seu trabalho junto à atual direção, que pediu aproximamento com o futebol e intermédio em futuras decisões:

“Conflito no Tupi sempre teve. Em um grupo de pessoas a divergência é natural. Mas sempre existiu um respeito maior pelas funções. Saio este ano porque acho que está tendo muita interferência na minha pasta, naquilo que estava disposto a fazer, que é o futebol. Em 2014 chegamos a ter isso um pouco, e acho que não foi um ano tão feliz. No ano passado, no final, muitos estranharam aquele fechamento que fiz de imprensa com jogadores, porque os bastidores do Tupi, ao meu modo de ver, não são calmos. Ano passado fiz o que o Leston chamava de ‘dois Tupi’s’. Muita gente estranhou aquele tratamento, mas não queria que os erros de 2014 acontecessem. Comecei 2016 modificando algumas coisas que a diretoria me solicitou em relação ao futebol de dar mais satisfação. Fiz um chat nosso e se o Maranhas se negar, me surpreenderá muito porque lido com ele todos os dias e sabe de todas as informações do Tupi, mas mesmo assim não está satisfeito. Existem algumas situações de interferência que, pela experiência que tenho de Tupi, sei que atrapalham a bola de entrar. Tivemos várias conversas e ontem (segunda) a presidente do clube falou comigo que para a gente ‘zerar’ tinha uma condição. Não sou contra ela nem ninguém participar do futebol, mas sim de não poder tomar ações que entendo que são do dia-a-dia do clube, que ajudam a dar três pontos na semana, porque não ganhamos a partida no jogo. Quando termina um confronto, já iniciamos a preparação para o outro e abro mão dos domingos e segundas  assistindo jogos e olhando scouts para na terça ser interpelado por pessoas que não tiveram esse trabalho, que nunca se dedicaram a ajudar o futebol do Tupi. Não que meu estudo ganhe jogo sozinho, mas me ajuda a montar um elenco competitivo, avaliar um trabalho de comissão técnica. Minha ‘briga’ é a bem do Tupi. Porque para me cobrar participação, tem que fazer o que eu faço, abrir mão do que eu abro. Sempre fui humilde, mas dessa vez vou deixar de lado: muito do sucesso do Tupi passa por isso. Ouço isso de profissionais que tiveram aqui e fazem muito sucesso. Condé, Leston, o próprio professor Ricardo (Drubscky). Todos são voluntários, o que não dá direito das pessoas se intrometerem ao que não é da sua alçada”.

Cloves Santos trabalhava no futebol do clube desde 2009
Cloves Santos trabalhava no futebol do clube desde 2009

Relação Cloves e Myrian

Cloves relatou ainda as deficiências dos últimos contatos com a presidente do clube, Myrian Fortuna, em seu último ano de mandato no triênio com início em 2014:

“O processo todo que desencadeou, para vocês entenderem bem: a Myrian me ligou no domingo e marcou uma reunião comigo 20h, mas disse que não podia. Aí ela falou comigo por telefone durante duas horas. Na minha vez de falar, ela disse que tinha um compromisso e não podia ouvir e não me deu retorno. Na segunda-feira, procurei ela para conversar, tentamos e ela deixou bem claro o que eu já disse: que a gente zera, mas tem que ser do jeito dela. Se não concordo, não tenho que participar. Então deixei meu cargo à disposição. Não confirmei minha saída para vocês porque quando você deixa seu cargo à disposição, você comunica olhando nos olhos dela. Ela marcou às 18h comigo um compromisso ontem, não apareceu, teve uma reunião com os jogadores hoje de manhã e eles pediram que eu ficasse, e ela disse que dependia de mim. Só que nesse tempo saiu uma nota oficial do Tupi dizendo que eu estava fora. Ela não me ligou para nada disso. Esperei a conversa dela até para agradecer os oito anos de Tupi. Então falam muito de respeito, mas foi o que faltou para mim hoje. Faltou por parte do Dr. Maranhas, que é uma pessoa que tinha como amigo pessoal e hoje tenho que avaliar isso; do Jarbas, que lida comigo 24h e não me avisou; dos demais diretores, menos do Felipe Fortuna, que foi o único que me ligou. Mostraram o quanto sou importante para eles, porque para o Tupi eu sei o quanto sou”.

 

Conversa com jogadores

Cloves se despediu dos atletas na segunda-feira e explicou a emoção: “Se tem uma pessoa no Tupi que merecia estar no vestiário da Série B, sou eu. Por tudo o que me dediquei e fiz. Não mais que eles, mas eu merecia muito e isso me foi roubado. Existe um processo de fritura natural e não somos bobos. Quando a pessoa começa a criar todo dia um tipo de polêmica e te colocando em uma zona de conflito, ela quer confusão. Fui aos jogadores ontem e disse que meu cargo esta à disposição porque tenho que ser honesto com as pessoas que contratei. ‘Estou dando um abraço em vocês porque hoje deve ser um dos dias mais difíceis da minha vida. E sinceramente não sei como vai ser meu amanhã’. Hoje sou oposição àquilo que estão fazendo no clube hoje e sou Tupi e não vou deixar de ser. Não vou deixar de ir em jogos, de exercer minha função porque ainda sou vice-presidente do Conselho Deliberativo eleito”.

Sobre uma possível debandada do elenco, Cloves rechaçou objetivamente: “Não tem desmanche, nem nada, porque não vou deixar ninguém bagunçar o Tupi enquanto eu puder”.

 

  “Interferências de Myrian”

O Toque de Bola pediu mais detalhes sobre as mudanças solicitadas pela direção e relatadas por Cloves: “Não sou contra ninguém participar. Sou contra você não gerenciar a pasta que é sua. Posso ser avaliado por semana, resultado que seja, mas para isso tem que estudar, porque o jogo do Villa Nova com o Tupi assisti quatro vezes. Futebol para você vencer tem que matar um leão por dia. Não que eu seja treinador de futebol, mas a experiência faz você aprender a ler scouts, ver posicionamentos. Isso é futebol. Fora isso, tem outras ‘n’ coisas que não suporto. Por exemplo, a liderança do grupo tem que ser única. Eles têm que sentir o senhor, que alguém comanda, se não vira uma zona e o grupo fica rachado. E querem mudar isso. Como? Com intromissões, perguntas, situações, ‘quero participar disso, daquilo’, e não nasci para dividir um comando, se não a responsabilidade passa a não ser minha mais, como já não tem sido no Mineiro. E acham que tudo sou eu, é bom que agora vão ver que tudo não é por causa do Cloves. O futebol estava muito bom”.

O ex-diretor carijó ainda garantiu que não vê problemas em trabalhar com outros profissionais da área, como o empresário Alberto Simão, um dos exemplos mais recentes no clube:

“Trabalhei com o Alberto, Maranhas, e trabalharia com qualquer outra pessoa. Dividir com dez não tem problema. Só tem que estudar. Domingo eu e a comissão técnica assistimos 12 jogos. A2, A3, abrimos mão da família. As pessoas ficam chateadas quando falo que tenho 70 jogadores catalogados. Mas tenho, peguei um por um, troco ideia com a comissão técnica, isso é normal. Essas coisas não tenho preocupação em dividir, é só ficar comigo. Quando o Júnior caiu quem ficou a noite toda trabalhando, quem ligou para o Ricardo? Fui dormir quase 4h da manhã e porque adoro fazer isso. Mas agora acabou e vou viver outra vida. Todas as contratações são passadas pela comissão técnica, o crivo dela é o fundamental. Não acredito que diretoria tenha que votar em jogador para ser contratado. Se houver algum tipo de questionamento, tenho scouts de todos”.

 

Salários atrasados

Sobre a parte financeira, Cloves confirmou que participou de dois casos por pedidos da direção, que encontrou dificuldades em pagar os salários de janeiro ao elenco, mesmo com a verba do Campeonato Mineiro, aproximados R$500 mil: “Me pediram esse mês para dividirem em duas parcelas o pagamento dos jogadores. E solicitaram também, pois estavam com dificuldades em pagar o bicho, de reparcelar ele. Aí me coloquei à disposição, negociei com os jogadores e reparcelei. Foi a única coisa que me pediram, mais nada. Em relação à parte financeira não sei como funciona, não participo disso”.

 

Os Fortuna e discussão com Áureo

Após a derrota para o Villa Nova, houve, segundo relatos, uma discussão entre o ex-presidente do Tupi, Áureo Fortuna, e Cloves Santos, no saguão do Estádio Mário Helênio. Cloves não negou: “Vou me reservar ao direito de não falar de família, que é muito sagrada. O que posso dizer é que para mim diretor não é torcedor e não expressa opinião em campo de futebol, não critica o time muito menos em saguão de estádio. Tem que ter uma postura de diretor. Óbvio que fico chateado com ‘n’ coisas, mas você nunca vai me ver criticar o time. Enquanto estava no futebol, jamais isso entra para o meu vestiário. Ali a gente só pensa em ganhar jogos. E ninguém bate em jogador com a camisa do Tupi. Ano passado, com o Kaio Wilker e Marco Goiano, fui o primeiro a comprar briga com a torcida. O torcedor pode tudo, mas eu não posso deixar de proteger o vestiário. Quando tem uma derrota, procuro mandar mensagem para todos os jogadores. Dou a eles um carinho que falta em muitos clubes. Fazia parte de uma família que um cuidava do outro. É mais ou menos isso”.

 

  Nota da redação

Nesta quarta-feira, 9, o Toque de Bola conversou com o ex-presidente do clube, Áureo Fortuna, que negou ter havido qualquer discussão após o jogo. Clique aqui para ler a íntegra da entrevista com Áureo.

 

  Cargo à disposição

Curiosamente, após derrota para o Uberlândia, Júnior Lopes havia deixado o comando técnico alvinegro após “deixar seu cargo à disposição”, o que demonstrava, na opinião do diretor, desinteresse no clube. No entanto, Cloves utilizou a mesma expressão ao falar com os jogadores e Myrian, mas explicou a diferença das situações:

“Uma coisa é um cara que está contigo há dois meses botar o cargo dele à disposição em um vestiário sendo que você vinha de duas derrotas e tendo um jogo importante na próxima semana; outra coisa é um cara que está contigo há quase dez anos, tem um contato diário, uma amizade que foi construindo um sonho durante muito tempo colocar o cargo à disposição e ele ser comunicado que saiu por um site. A diferença é essa, chama-se respeito com o ser humano, coisa que faltou”.

 

Presidência do Tupi

Cloves garantiu não ter interesse na presidência carijó, mas mostrou vontade em fazer parte de chapa de oposição para o mandato de 2017 a 2019: “Não pretendo liderar, mas fazer parte de um grupo que queira fazer o Tupi crescer da forma que vem crescendo. Um grupo que foi criado e agora com essa Série B, no momento mais importante, acabou sendo desfeito. Esse grupo com Myrian e Maranhas, não participo mais, mas com quem queira o melhor para o Tupi estarei. Ser presidente não é meu desejo, mas sim participar de um grupo que se uma novamente pelo melhor para o Tupi. O que importa é o objetivo em comum”.

Capitão da equipe, Osmar conversou com o Toque de Bola ao final do treino da manhã, em Santa Terezinha
Capitão da equipe, Osmar conversou com o Toque de Bola ao final do treino da manhã, em Santa Terezinha

Capitão Osmar, sobre Cloves: “Vou levar a amizade dele para a vida”

O lateral e capitão do Tupi, Osmar, falou com a imprensa na manhã desta terça se colocando ao lado de Cloves, antes do anúncio oficial: “Nossa relação com Cloves é de confiança e carinho, vou levar a amizade dele para a vida. Mas não podemos interferir no que tange a diretoria, eles que têm que decidir. Nós queremos e contamos que tudo possa ser resolvido, que eles possam continuar fazendo o seu bom trabalho. Se porventura acontecer, temos que focar no trabalho, porque temos um jogo muito difícil pela frente”.

Apesar do extra-campo, a atividade em Santa Terezinha foi realizada de forma tranquila. Drubscky utilizou todo o grupo no treino, aparentando a serenidade habitual. Após o exercício, junto com o auxiliar Júlio Cirico, conversaram em particular com Hiroshi. Os atletas não comentaram a saída de Cloves. Quando perguntados, Glaysson, Fabrício Soares e Osmar disseram que “não sabiam de nada”.

 

Nota da redação

Após a entrevista, o Toque de Bola fez contato com as pessoas citadas por Cloves em assuntos polêmicos. O Portal segue à disposição para ouvir qualquer pessoa que tenha sido citada na entrevista e queria se manifestar.

 

Texto: Bruno Kaehler

Foto: Toque de Bola

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