Que Minas Gerais não tem mar, todo mundo já sabe. Mas e o que dizer de surf, surfistas e campeonato da modalidade? Aí, a conversa já é outra…
No embalo do início da Liga Mundial de Surf (WSL), em Pipeline, no Havaí, o Toque conta a história do Campeonato Mineiro da agora modalidade olímpica. Isso mesmo! Competição que nasceu em 2001, teve um hiato de 8 anos, foi realizada anualmente entre 2009 e 2018 e já teve juiz-forano campeão que, claro, já surfou Nas Ondas do Toque.
Origem
Quem nos ajuda a contar essa história é o organizador da competição, amigo do surf mineiro e empresário de Belo Horizonte, Kau Cavalcanti. Seu irmão, Duca, ex-surfista profissional, é o grande responsável pelo nascimento do Mineiro de Surf.
“A ideia surgiu pelo meu irmão Duca Cavalcanti, que foi surfista profissional, e veio trabalhar em Minas Gerais. Ele teve a oportunidade de conhecer vários surfistas mineiros e decidiu fazer o primeiro evento, no Rio de Janeiro, na Barra da Tijuca (em 2001). Neste evento, as ondas estavam grandes, e foi o maior sucesso. Teve apoio da Rusty, marca de prancha Californiana, que esteve conosco desde o primeiro e até os mais recentes”, conta o organizador que revelou também o paradeiro do parceiro idealizador do Mineiro. “O Duca, voltou a morar no Rio de Janeiro e tem uma escola da modalidade, chamada Surf Didático, transformando o sonho de surfar de varias pessoas em realidade.”
Hiato
Logo após a primeira edição, o campeonato sofreu uma longa pausa. “O primeiro evento, do encontro do Duca com alguns surfista de Minas, ocorreu bem. Mas o segundo evento demorou 8 anos para acontecer. Fui visitar um dos atletas da edição inicial, que comentou com carinho sobre ela. A Rusty estava com uma verba disponível para Minas. Então, os convenci para voltarmos a fazer o Campeonato Mineiro de Surf. Até os atletas entrarem na água, foram 30 dias”, relembra Kau.
O Mineiro de Surf já mudou de casa, sendo realizado em outras praias cariocas. “O segundo evento, foi em Búzios, na Região dos Lagos fluminense, também com altas ondas. O terceiro e o quarto também foram em Búzios, mas não tinham ondas satisfatórias. Do quinto até o décimo primeiro, todos foram feitos no Rio de Janeiro, nas praias da Macumba, Grumari e Barra de Tijuca”, explica Cavalcanti. “Em todos os campeonatos, temos a participação da associação do lugar, para haver o envolvimento dos surfistas locais e também a documentação de autorização de uso da praia pelos competidores mineiros”, acrescenta.
JF no topo
Na última edição realizada do Campeonato Mineiro de Surf, um juiz-forano comemorou o título. Rafael Cooper, nascido em Juiz de Fora, radicado no Rio de Janeiro e que comentou o sucesso do surf nas Olimpíadas de Tóquio na radio web Nas Ondas do Toque, ficou com o primeiro lugar na praia da Barra da Tijuca.
“Fui campeão no ano de 2018. O campeonato se divide em duas categorias: pessoas que nasceram em Minas Gerais e residem em Minas Gerais e pessoas que nasceram em Minas Gerais e residem no litoral (esta última categoria ainda tem os mineiros que moram em outros estados e os nativos de outro estado que residem em terras mineiras a mais de cinco anos). Isso por que há uma diferença considerável em quem pode praticar o esporte semanalmente em contraste com pessoas que precisam viajar e o praticam com pouca frequência. No meu caso, fui campeão da categoria residentes no litoral”, explica Cooper que, como não houve outra disputa desde que conquistou o título, é o atual campeão mineiro de surf de sua divisão.
Competir para integrar
“A competição é vista pelos participantes como uma forma de integrar a comunidade acima de tudo. Competir faz parte da natureza do esporte e certamente é a melhor forma de aproximar todos. A partir dela, amizades são criadas, viagens são planejadas e o engajamento tende a crescer. Do ponto de vista competitivo é muito interessante também poder disputar baterias, e sentir um pouco como é esse lado do surf. Quando você surfa competindo o nível de intensidade que você se propõe é muito maior. Não existe deixar passar uma onda porque não gostou de como ela veio, não existe não tentar uma manobra porque não valeria a pena. Você acaba indo a limites que em dias normais praticando o esporte não tentaria”, relata Rafael.
Segundo o surfista juiz-forano, a turma da cidade natal é bem representativa nos Campeonatos Mineiros nas águas cariocas. “A galera de Juiz de Fora é o segundo maior grupo do campeonato, até por conta da nossa proximidade com o Rio de Janeiro. Ficam atrás apenas do grupo de Belo Horizonte que é de onde surgiu. Ao longo dos anos, a participação foi crescendo cada vez mais, principalmente por conta do engajamento e da proximidade do pessoal com o litoral.”
Mineirada boa de surf
E o campeão juiz-forano crava: mesmo sem mar, os surfistas de Minas têm talento. “Sim, mineiros são bons de surf e possuem um elemento que é admirado por todos os meus amigos cariocas, que é a paixão pelo esporte. Muitos cariocas aqui no Rio, às vezes, ficam com preguiça de acordar cedo para ir surfar quando o mar não está ideal, enquanto o pessoal vem de Belo Horizonte, Juiz de Fora, Divinópolis, acordando 2h da manhã, enfrentando horas de estrada só para poder estar no mar em contato com as ondas. Isso certamente é o maior trunfo de todos os mineiros.”
Tem gente que é tão boa que agora ensina a modalidade em terras cariocas. “Na categoria de mineiros que moram fora de Minas Gerais, o Pedrinho Ribeiro é o maior campeão. Ele ganhou quase todas as etapas apos criarmos esta categoria. Foi capa de revista Surfar, e tem uma escola de surf no Rio de Janeiro atualmente”, conta Kau.
Casa alugada
Claro, organizando um evento de surfistas de um estado que não tem mar, Cavalcanti ouviu piadinhas sempre. Além da motivação pelo desafio, ele tem uma resposta bem humorada para quem não acredita na realidade do Campeonato Mineiro de Surf.
“Sempre foi uma motivação, gosto de fazer coisas diferentes, desde sempre na minha vida pessoal e profissional. A quem lança essas piadinhas, que sempre tem, a minha resposta é assim: quando você não tem uma casa na praia o que você faz? Aluga! É o que fazemos. Alugamos a praia pelo período do nosso evento”, diverte-se o organizador.
No rio?
Após a paralisação das edições do evento, que habitualmente ocorre em outubro, a intenção é voltar no próximo ano. Onde? Esta pode ser uma novidade que tornará ainda mais curioso do Mineiro de Surf.
“Espero conseguir realizar o próximo evento em 2023. A galera gosta muito da (praia) Macumba e Recreio. Mas, na verdade, onde tiver onda boa a galera vai. Meu interesse é fazer o campeonato em Minas Gerais”, deseja Kau. Mas o estado não tem mar. Então, onde seria? “Nas ondas do Rio Doce, em Governador Valadares. Mas esta logística é um pouco mais difícil pela frequência e pelo pequeno prazo das ondas, normalmente entre novembro e fevereiro, na época de chuvas, na qual o volume do rio aumenta bastante”, explica.
Texto: Toque de Bola – Wallace Mattos
Fotos: Duca Fotos/Facebook/Campeonato Mineiro de Surf; e arquivo pessoal/Rafael Cooper